Francisclareando – Produzir frutos de Penitência

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“Eis o tempo de conversão…”

Estamos iniciando a quaresma, tempo em que nos detemos mais a contemplar ativamente o mistério da entrega de Jesus para resgatar a criação inteira das garras da morte. Tempo de penitência que, em nossa espiritualidade, é dom de Deus, é ação em favor da vida. A penitência é resposta-obediência ao grito da vida fragilizada, indefesa, ferida, ameaçada. É “ob audiência” (ouvir de perto) à vida que, ao nosso lado, quer atenção, precisa de nosso braço para arrimar-se, quer que lhe seguremos a mão, necessita nosso ombro para chorar ou, simplesmente se alegra ao nos ter perto.

“Foi assim que o Senhor concedeu a mim, Frei Francisco, iniciar uma vida de penitência: como estivesse em pecado, parecia-me deveras insuportável olhar para leprosos. E o Senhor mesmo me conduziu entre os leprosos e eu tive misericórdia com eles. E enquanto me retirava deles, justamente o que antes me parecia amargo se me converteu em doçura da alma e do corpo. E depois disto demorei só bem pouco e abandonei o mundo (Test 1-3).

Para Francisco, a penitência é sempre vital, sempre uma urgência, única forma de entrar no Reino: “Fazei penitência fazei frutos dignos de penitência porque logo morreremos” (RnB 21,3). E a todos os que querem servir ao Senhor Deus dentro da santa Igreja católica e apostólica… que todos perseveremos na verdadeira fé e penitência, porque de outra maneira ninguém pode salvar-se” (cf. RnB 23,7). “Bem-aventurados os que morrem em penitência, porque estarão no reino dos céus” (Rnb 21,7). “E te damos graças porque o teu próprio Filho virá na glória de sua majestade para… dizer a todos que te conheceram e adoraram e te serviram na penitência: Vinde, benditos de meu Pai, recebei o reino, que está preparado para vós desde a origem do mundo” (RnB 23,4).

Francisco e Clara de Assis quiseram entrar no Movimento dos Penitentes, forte em seu tempo. Mas seu desejo de seguir o Cristo pobre ultrapassou as fronteiras do movimento pauperístico. Deixaram tudo, para se entregar inteira e escandalosamente à vida de penitência. Qualquer das primeiras fontes confirma o espanto violento da família e da sociedade ante a radical ruptura. Escândalo maio provocou a decisão de Clara, dadas as condições da mulher na época. Para ela, fazer penitência é fruto da iluminação divina: “Depois que o altíssimo Pai Celeste se dignou iluminar o meu coração pela sua graça para que eu fizesse penitência conforme o exemplo e o ensinamento de nosso pai São Francisco, pouco depois da conversão dele, eu lhe prometi obediência voluntariamente, junto com minhas Irmãs” (RSC 6,1).

Para ela também, a penitência é caminho para o reino, conforme diz à amiga Inês de Praga: “Por isso vos livrastes das vestes, isto é, das riquezas temporais, para não sucumbir de modo algum ao lutador e poder entrar no reino dos céus pelo caminho duro e pela porta estreita” (1In 29).

A vida de penitência é um caminho que exige decisão, incessante vigilância: “Não perca de vista seu ponto de partida, conserve o que você tem, faça o que está fazendo e não o deixe, mas, em rápida corrida, com passo ligeiro e pé seguro, de modo que seus passos nem recolham a poeira, confiante e alegre, avance com cuidado pelo caminho da bem-aventurança. Não confie em ninguém, não consinta com nada que queira afastá-la desse propósito, que seja tropeço no caminho, para não cumprir seus votos ao Altíssimo na perfeição em que o Espírito do Senhor a chamou” (2In 11-14).

Mas a força maior vem da contemplação e seguimento de Jesus Cristo: “Veja como por você ele se fez desprezível e o siga, sendo desprezível por ele neste mundo. Com o desejo de imitá-lo, mui nobre rainha, olhe, considere, contemple o seu esposo, o mais belo entre os filhos dos homens feito por sua salvação o mais vil de todos, desprezado, ferido e tão flagelado em todo o corpo, morrendo no meio das angústias próprias da cruz” (2In 19-20).

Acolhamos o convite que nos faz a Igreja neste tempo específico de contemplação do Cristo que “se fez por nós obediente até à morte de cruz” (Fil. 2,8). Entremos no clima de penitência que caracterizou a vida de Clara e Francisco. Acolhamos o alerta do querido santo e sábio D. Hélder Câmara: “Não há penitência melhor do que aquela que Deus coloca em nosso caminho todos os dias”. Penitência que, conforme já se disse, é ação em favor da vida. É sempre ativa, misericordiosamente ativa. É planta, lavoura fecunda, que se conhece pelos frutos. É mudança, conversão. Que na manhã de Páscoa, possamos presentear o Ressuscitado, com muitos e dignos frutos de penitência.

Por Irmã Maria Fachini – Catequista Franciscana

Fonte: Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas

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