Foto: Arquivo/Osid
Votos de pobreza, dedicação aos mais necessitados, missões pelo mundo. Tudo isso pode fazer parte da vida das freiras. Para conhecer melhor esse universo, a TV Aratu e o Aratu On iniciam, nesta terça-feira (13/8), a série especial “Vocação Para a Fé”.
Com texto de Lorena Dias, imagens de Raimundo Carvalho e Lemuel Castro (drone), produção de Camila Soeiro, arte de Vivian Alecy e edição de vídeo de Susan Rodrigues, a primeira reportagem foi ao ar no Aratu Notícias desta terça, 13 de agosto, com “O Legado de Irmã Dulce”. Há 91 anos, nesta mesma data, Maria Rita de Sousa Brito Lopes Pontes se tornou freira, passando a ser conhecida como “Irmã Dulce”, em homenagem à própria mãe, que já havia morrido.
A data também foi escolhida pela Igreja Católica para celebrar a Santa Dulce dos Pobres, a primeira santa brasileira, o “Anjo Bom da Bahia”.
Assista, abaixo, à primeira reportagem:
É na Cidade Baixa, no bairro de Roma, em Salvador, onde fica o maior legado da mais famosa freira da Bahia. As Obras Sociais Irmã Dulce (Osid) abrigam um dos maiores complexos de saúde 100% gratuito do Brasil, com 23 núcleos, cerca de 700 leitos e mais de 6 milhões de procedimentos ambulatoriais por ano, no estado.
“Tem nos escritos dela que foi o dia que ela se sentiu mais feliz, o que fez os votos dela e se tornou freira, mesmo”, lembra a freira Olívia Lucinda da Silva, ou simplesmente Irmã Olívia, integrante da Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, a mesma que Dulce.
As duas se conheceram na década de 1970, no galinheiro que Dulce transformou em ambulatório para atender aos mais pobres, após o “Anjo Bom da Bahia” retornar a Salvador, depois de ter feito a formação religiosa no estado de Sergipe.
“Quando eu cheguei, a irmã foi direto para o galinheiro onde Irmã Dulce estava fazendo curativo nos pobres. Aí a gente ‘ficou tudo assim’, ao redor do galinheiro, e ela levantou e cumprimentou todo mundo, mas quando ela me viu, puxou meus cabelos e eu senti, assim, uma uma coisa diferente, um olhar diferente. Aí eu fiquei logo apaixonada por ela. Senti um amor profundo por Irmã Dulce naquele”, conta Irmã Olívia.
A freira, que fazia parte da mesma Congregação de Irmã Dulce, ficou ao lado dela até o último momento. “Irmã Dulce era minha mãe. Eu sentia como se fosse minha mãe. Eu tinha tanto amor à Irmã Dulce – e tenho, ainda hoje -. Mesmo [quando ela estava] entubada, quando ela abria os olhos e não falava… Mas fazia um gesto pra gente olhar os doentes, porque ela se preocupava com os pacientes. […] O amor dela era tão forte que, quando ela pegava na mão da gente, ‘acendia’ um fogo”, completa Olívia, acrescentando que Dulce prestava assistência a todos, dia e noite.
Assim como Olívia, Maria Gorete da Silva, a Irmã Gorete, também teve a oportunidade de ver de perto o trabalho da santa baiana. Atualmente com 72 anos, ela é a freira mais antiga do Instituto Filhas de Maria Serva dos Pobres, ou Instituto das Irmãs Dulcianas, criado por Santa Dulce na década de 1980.
“Eu conheci Irmã Dulce pela televisão e achei bonito o trabalho dela, saindo da Igreja do Bonfim, carregando aqueles mendigos com a esteira… quando ela foi expulsa [pelo prefeito da época, Wanderley Pinho, do espaço que fez de ambulatório, na Cidade Baixa]”, relembra.
Ela contou ainda que chegou para ser voluntária, mas soube por Dulce que a pretensão desta, há muito tempo, era fundar uma congregação. Ao perguntar à Gorete se ela desejava fazer parte, ouviu a resposta de uma entusiasta: “Desde já! Porque eu já sou sua filha”. Depois, Irmã Dulce a abraçou. “Fiquei ‘toda’ feliz da vida!”.
O Instituto das Irmãs Dulcianas fica localizado em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador (RMS). O local, que nasceu como orfanato, hoje abriga o Centro Educacional Santo Antônio, o convento e o centro de panificação que ajuda na manutenção das atividades do complexo.
A maior parte das irmãs trabalha nas Obras Sociais, a exemplo da Irmã Maiara Santos, a mais nova do instituto criado por Dulce. A jovem decidiu ser freira depois de ler um livro que contava a história da santa.
“Quando eu li o livro de de Irmã Dulce virei a chave. Era uma religiosa que viveu aqui na Bahia e transformou a vida de muitas pessoas, acreditando na providência divina e, sobretudo, que o amor é capaz de transformar e salvar vidas. Meu despertar vocacional começou a partir daí”, afirma.
Maiara, 28 anos, atua na cultura organizacional da Osid, ao levar ao funcionários do hospital fundado por Irmã Dulce os valores do “dulcismo”.
“Irmã Dulce fez uma revolução do bem na cidade de Salvador, em uma época que não existia SUS [Sistema Único de Saúde], não tinha saúde pública, em que a gente não ouvia falar sobre saúde coletiva e quando o machismo ainda era muito forte. Então, Deus coloca, no coração de uma mulher, um chamado de servir aos mais necessitados”, reflete.
Para a jovem freira, Irmã Dulce prova que o amor é capaz de transformar e de salvar vidas. “Acho que esse é o grande legado que ela nos deixa, de que todo mundo pode fazer alguma coisa por alguém. Não existe ninguém que não possa fazer algo pelo outro”, conclui Irmã Maiara.
A reportagem sobre o legado de Irmã Dulce será exibida novamente no Bom Dia Bahia desta quarta-feira (14/8). Depois, por mais três semanas, sairá uma nova reportagem a cada terça.
Você também pode assistir à programação da TV Aratu (canal 4.1) pelo aratuon.com.br/aovivo ou em matéria d Aratu On, logo após a exibição na TV.
SOBRE SANTA DULCE
Baiana de Salvador, Irmã Dulce era filha de um dentista, professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), e de uma dona de casa. Desde pequena, demonstrava vocação religiosa e era fervorosa devota de Santo Antônio, mas abraçou a vida religiosa em 1933, quando entrou para a Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus. Em sua primeira missão com o hábito de freira, foi designada para ensinar crianças e assistir a comunidades pobres da Cidade Baixa, em Salvador.
Ainda nos anos 1930, fundou a União Operária São Francisco, considerado o primeiro movimento cristão operário baiano, e o Círculo Operário da Bahia, grupo que se engajava na promoção cultural e social dos trabalhadores, fomentava a luta dos seus direitos e difundia o conceito de cooperativas.
De acordo com informações fornecidas pelas Obras Sociais Irmã Dulce (Osid), nessa época, ela iniciou “um trabalho assistencial nas comunidades carentes, sobretudo nos Alagados, conjunto de palafitas que se consolidava na parte interna do bairro de Itapagipe, em Salvador”.
“Nessa mesma época, começava a atender também os operários, que eram numerosos naquele bairro, criando um posto médico”, ressalta a organização.
Em 1939, a religiosa foi uma das fundadoras do Colégio Santo Antônio, uma instituição voltada aos operários e seus filhos. Já nessa época, ela demonstrava preocupação pelos cuidados de saúde dos pobres. Chegou a promover a invasão de casas abandonadas para transformá-las em abrigo para doentes mas, expulsa, na década seguinte decidiu transformar em um hospital improvisado o galinheiro de seu convento. Era o embrião do Hospital Santo Antônio, centro de um complexo médico, social e educacional que funciona até hoje.
Em seu primeiro hospital, improvisado no antigo galinheiro, Irmã Dulce tinha um ambulatório com capacidade para atender a 70 pessoas. Captou recursos e em 1960 transformou aquilo em um hospital de verdade, com 150 leitos. Uma nova reforma foi feita e, menos de 10 anos depois, o hospital tinha capacidade para atender a 300 pacientes. Em 1983, ampliado novamente, chegou a 800.
Isso hoje pode parecer algo simples, mas antes do advento do SUS, o acesso à saúde no Brasil não era universal. As pessoas mais pobres não conseguiam atendimento. O colapso social que Salvador viveu no período teria sido muito mais doloroso para a população pobre, muito pior, se não fosse a atuação de Irmã Dulce. Ela antecedeu, em muitas décadas, o papel que o SUS teria no futuro.
Canonização: a cerimônia de Canonização de Irmã Dulce aconteceu no dia 13 de outubro de 2019, no Vaticano, na Itália. Oficialmente, ela passou a ser chamada de Santa Dulce dos Pobres, tendo como data litúrgica o dia 13 de agosto. A freira, conhecida como o Anjo Bom da Bahia, é a primeira santa brasileira e sua canonização é a terceira mais rápida da história (27 anos após seu falecimento), atrás apenas do Papa João Paulo II (9 anos após sua morte) e de Madre Teresa de Calcutá (19 anos após seu falecimento).
CONGREGAÇÃO DAS IRMÃS MISSIONÁRIAS DA IMACULADA CONCEIÇÃO DA MÃE DE DEUS – Pela qual Irmã Dulce se consagrou freira
A Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus nasceu no Brasil, mas se internacionalizou e hoje, além do território nacional – com unidades espalhadas por diversos estados como Sergipe, Pernambuco, Piauí e São Paulo, possui representações em países como China, Alemanha, Taiwan, Filipinas, Namíbia, Angola, Vietnã e Estados Unidos.
Inspirada no legado da Mãe dos Pobres, a congregação atua com projetos sociais nas áreas de saúde e educação, com pessoas em situação de rua e vulnerabilidade social, além de refugiados e povos indígenas.
INSTITUTO FILHAS DE MARIA SERVAS DOS POBRES – Congregação fundada por Irmã Dulce
Com sede no município de Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador, o Instituto Filhas de Maria Servas dos Pobres conta com unidades também em Aracaju (SE) e Petrópolis (RJ), reunindo religiosas que abraçam a missão de perpetuar o legado de Santa Dulce dos Pobres e colocar em prática valores como amor ao próximo, empatia e solidariedade.
SOBRE O DULCISMO
As Obras Sociais Irmã Dulce (Osid) lançaram, em abril de 2024, a cartilha “Dulcismo – O jeito Dulce de pensar, ser e agir”, dando um passo importante para a promoção de uma imersão ainda maior em sua cultura organizacional.
Dialogando diretamente com os colaboradores da OSID, a cartilha “Dulcismo – O jeito Dulce de pensar, ser e agir” fala sobre os valores intrínsecos à identidade da instituição, orientando que sejam compreendidos, internalizados e aplicados nas ações cotidianas.
A proposta é olhar para o público assistido nas Obras Sociais pelas lentes do Dulcismo, ou seja, com amor, empatia e inclusão. E, do mesmo modo, propor que cada colaborador possa fazer o seu trabalho conectado aos valores da obra, para servir com perseverança, humildade, simplicidade e fé, colocando em suas ações sentimentos de compaixão, gratidão e paz.
Fonte: aratuon.com.br