Natureza de Francisco e o sopro do Evangelho

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Éloi Leclerc, frade francês, escreveu muitos textos sobre “seu” Francisco de Assis, seu e nosso. A figura do Poverello foi seu campo de pesquisa e seu grande tema, diria mesmo sua paixão. Um dos seus livros fundamentais foi, certamente, “Francisco de Assis. O retorno ao Evangelho”, publicado pela Vozes e CEFEPAL, infelizmente esgotado. No epílogo desta obra o frade, falecido no começo deste século, disserta sobre o encontro do Evangelho com a história. Esse tema era muito querido de Marie-Dominique Chenu, teólogo dominicano. Achava este que Francisco era grande por ter enxertado o evangelho na história de seu tempo. Na primeira parte de seu epílogo, Leclerc fala da rica natureza de Francisco e o sopro do Evangelho. Tento colocar aqui o essencial do texto. O texto é minha base e não o transcrevo letra a letra.

Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM

Rica natureza de Francisco

Trata-se de um fato incontestável. Lendo o primeiros biógrafos do santo tem-se uma impressão irresistível: uma personalidade original e criativa, um ser dinâmico, cheio de claridade. Sai dele uma irradiação de plenitude de vida, ao mesmo tempo simples, forte e nova. É alguém que nos leva para caminhos ainda não percorridos. Com ele a vida retoma o perfume das origens. Traço fundamental desta personalidade sem paralelo é uma capacidade extraordinária de se comunicar com os seres, um poder sempre renovado de deixar-se maravilhar, de acolhimento, de devotamento, em resumo uma hospitalidade de espírito e de coração que o torna atento a todas as criaturas.

Tomás de Celano faz esta observação: “Os sentimentos naturais de seu coração eram suficientes para torná-lo fraterno a toda criatura”. Louis Lavel tinha razão ao escrever: “Talvez nunca tenha havido consciência mais aberta do que a de Francisco, mais delicada nem mais vivamente vibrante a todos os toques que lhe vinham da natureza, dos outros santos e de Deus”. Georges Duby, grande historiador: “De parceria com Cristo, foi Francisco o grande herói da história cristã. Pode-se afirmar sem exagero que o que resta de cristianismo vivo provém diretamente dele”.

O sopro do Evangelho

O sopro do Evangelho, penetrando nesta rica natureza, liberou todas as suas potencialidades. A conversão não quebrou nada da personalidade de Francisco. Pode acontecer que um excessivo ascetismo quebre o ‘natural’ de uma pessoa. Esta pode se tornar meio avessa às realidades visíveis e tangíveis. Nada disso aconteceu com Francisco. Tudo o que era precioso em sua natureza continua a vibrar sob a mão de Deus. Mesmo a riqueza afetiva, o sentimento estético e o lirismo criador. A conversão nada secou.

Sua conversão foi essencialmente comunhão com uma pessoa viva, com Jesus Cristo. Unindo-se a esta pessoa Francisco pode ver suas potencialidades liberadas do que ainda podia ser acanhado. A natural hospitalidade de seu espírito e de seu coração se abriram às dimensões do mundo. O beijo do leproso é o mais emblemático desta abertura. A partir de então sua comunhão com as criaturas seria universal.

Concluindo

“Diante da pessoa de Jesus, atitude de Francisco é toda de amor. Poderia ser de curiosidade, de interesse, de temor, mas não. É toda gratidão, assombro, encanto. Cristo lhe aparece na capelinha de São Damião, crucificado, mendigo, pedindo-lhe ajuda, a alma de Francisco fica verdadeiramente e para sempre “colada” à pessoa de Jesus” (Frei David Azevedo, São Francisco, Fé e Vida, Ed. Franciscana de Portugal, p.22).


Imagem: Francisco de Zurbarán (1598–1664)

Fonte: Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil

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