No Dia Nacional dos Povos Indígenas, Frei Sebastián Robledo partilha a espiritualidade e a vivência junto ao povo Munduruku na Missão São Francisco, revelando uma fé que se constrói no afeto, no respeito e na escuta.
Na margem do rio Cururu, no coração da floresta amazônica, onde o tempo parece escorrer em ritmo de oração, há um lugar onde a fé se aprende caminhando, ouvindo e partilhando. Neste 19 de abril, Dia Nacional dos Povos Indígenas, a memória reverencia a resistência e a sabedoria dos povos originários. Mas, para quem vive nesse chão, como Frei Sebastián Robledo, a data não é apenas celebração: é também reencontro com uma história viva, com nomes, rostos e vozes que fazem da missão um lugar de reconstrução, não de imposição.
Argentino, franciscano, apaixonado pela Amazônia, Frei Sebastián chegou à Missão São Francisco — conhecida como Missão Cururu — levado por um desejo antigo de viver entre os povos indígenas. “Eu conheci a missão Cururu quando for o centenário da chegada dos primeiros missionários e missionárias (OFM e SMIC). Nesse ano realizou-se realizou um mutirão de visitas e foram convidados muitos religiosos e religiosas do Pará. No meu caso fazia alguns anos que eu estava na busca de uma experiência junto aos povos indígenas na América latina. Quando eu soube desse evento, perguntei se (desde Argentina) eu poderia participar. Eu fui aceito logo e (sem falar nada de português) conheci pela primeira vez o Povo Munduruku e fiquei apaixonado por eles e pela Amazônia.”, recorda. O convite foi aceito. E ali, diante do povo Munduruku e da imensidão da floresta, ele entendeu que a missão não era sobre ensinar, mas sobre desaprender. Uma das características da missionariedade franciscana é sem dúvida a PRESENÇA. Estar presentes sendo discípulos, aprendizes, numa desconstrução cotidiana. Sabendo que nós da sociedade ocidental não somos mais, ou maiores, do que os nossos parentes indígenas. Somos diferentes, sim! E muito!!! Mas hoje estamos aqui na missão para ACOMPANHAR processos de fé, processos de humanidade, processos de identidade cultural, processos de construção histórica. Somos parte do caminho do Povo Munduruku, mas muito cientes que os protagonistas na construção da própria história são eles.”
Acompanhamento, no caso da Missão Cururu, é verbo em movimento. A missão — uma das mais de 140 aldeias que compõem a Mundurukânia — abriga hoje cerca de 900 pessoas. Sob responsabilidade pastoral dos frades estão 45 aldeias espalhadas pelos rios Cururu, Tapajós, Teles Pires, Juruena, Anipiri e Wareri. Cada comunidade tem seu tempo, seu padroeiro, sua festa e seus conflitos. “Tentamos, em cada visita, fortalecer a fé e promover espaços de formação e diálogo”, explica. Das celebrações aos debates sobre o uso da internet entre jovens, tudo acontece em torno da partilha.
Neste abril indígena, Frei Sebastián nos convida a celebrar não só as lutas e conquistas, mas o modo de ser e sentir desses povos. “Celebramos uma cultura, uma língua, um jeito de pensar o mundo”, diz, enquanto destaca o quanto a espiritualidade indígena, com sua reverência à vida e à terra, tem a ensinar ao Ocidente. Não à toa, a encíclica Laudato Si’, do Papa Francisco — que completa dez anos em 2025 — ecoa essas vozes. “É claro que não devemos idealizar os povos indígenas.. Sem dúvida eles sabem respeitar a criação, mas também às vezes entram em conflito com ela… e isso traz algumas crises. Com tudo na Laudato Si temos recebido um legado que vem das periferias (no nosso caso amazônica) para o mundo todo em termos de cuidado da casa comum.”
É também em sintonia com São Francisco de Assis que Frei Sebastián enxerga os povos originários como guardiões da Criação. “A famosa frase ‘tudo está interligado’ é indígena”, afirma. Em um tempo onde a desconexão parece estrutural, o modo indígena de viver desafia e inspira..
Ao falar sobre o futuro, Frei Sebastián cita a Querida Amazônia, sonhando com uma Igreja cada vez mais servidora, menos centrada em si mesma. “Eu sonho junto com ele… Eu sonho com uma Igreja brasileira deslocada do centro e abraçando as periferias…. Eu sonho com uma Igreja brasileira onde ‘o título de «servidor» – diácono – ofusque cada vez mais o de eminência (Papa Francisco aos novos cardeais, 07.12.2024)’.” afirma com esperança serena. Porque, afinal, para quem vive a missão como ele, o Evangelho se escreve em caminhada.
Fonte: ofmsantoantonio.org