Frei Matheus José Borsoi e Frei Rodrigo José Silva
Curitiba (PR) – “Muitos religiosos querem ser glorificados, não consagrados”; “É preciso rever o que é velho em nossas vidas”; “Não devemos ter medo de aceitar a cruz”. Estas foram algumas provocações do bispo auxiliar da Arquidiocese de Curitiba, Dom Amilton Manoel da Silva, deixadas aos participantes, no último domingo, do Encontro Conferência da Família Franciscana do Brasil (CFFB), núcleo do Paraná. Este encontro, que começou no sábado, contou com a presença do presidente da CFFB nacional, Frei Éderson Queiroz, OFMCap, e teve por objetivo fomentar a convivência, a partilha e a formação da família franciscana e dos simpatizantes do carisma de São Francisco e Clara de Assis no Estado paranaense.
Os franciscanos foram acolhidos no Teatro do Colégio Bom Jesus pelos frades estudantes do tempo da Filosofia da Província Franciscana da Imaculada (OFM). Frei João Mannes OFM, presidente da Associação Franciscana de Ensino Senhor Bom Jesus, anfitrião do evento, deu as boas vindas a todos os presentes.
Dom Amilton lembrou que a Igreja do Brasil está entre as que possuem maior número de Bispos oriundos da vida religiosa (cerca de 40% segundo dados recentes), o que dá, em suas palavras, um colorido bonito nas diferentes dioceses.
Citando outro bispo religioso, Jorge Mario Bergoglio, o nosso Papa Francisco, compara-o em vitalidade, dinamismo e jovialidade a São João XXIII, que quando Papa, ousou “abriu as janelas” da Igreja idealizando o Concílio Vaticano II.
Em suas provocações disse que devemos ser novidade para o mundo, para a comunidade, para nossas congregações. Não podemos ser odres velhos, presos ao secularismo, mas devemos estar abertos a uma constante conversão cotidiana que nos levará a uma conversão pastoral.
Alertou ainda sobre o perigo de adotar um discurso ideológico/partidário. O ideal de Jesus Cristo não pode ser “ideologizado”. Nossa única bandeira deve ser a do Evangelho. Por outro lado, lembra que a formação também não deve ser alienada, excessivamente teórica e distante da realidade prática. É preciso tomar ciência do mundo ao redor e de seus muitos desafios, saber interagir com eles, ser presença cristã, viva e atuante junto aos excluídos de nosso tempo, fazer opção por eles, como fizeram Francisco e Clara em seus dias.
Recordou Dom João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica no Vaticano, trazendo números que apontam a desistência anual de cerca de 3 mil religiosos e religiosas.
Dom Hamilton reconheceu que vivemos uma profunda crise de fé, inclusive dentro da vida religiosa e consagrada e aponta a solidão o excesso de compromissos e incredulidade como três dos principais fatores que levam a desistência da vida consagrada. Lembrou também que muitos optam por esta forma de vida com ideais escusos, buscando títulos, carreirismo, liturgismos, estabilidade querem ser glorificados. Muitos que deveriam ser representantes querem assumir o lugar Daquele que representam.
Disse ainda da necessidade atual de se experimentar Deus: “Nos consagramos para ser e para fazer uma experiência de Deus, primeiro para nós, depois para os outros. As pessoas estão cansadas de ouvir falar de Deus, elas querem ter, a partir de nós, uma experiência de Deus”.
É preciso rever o que há de velho e que já não consegue sustentar a realidade dos jovens, salienta o bispo, afirmando ainda que nosso testemunho de vida vale mais que o mais belo discurso, que a adesão se dá pela atração por uma vida autêntica e não pelo proselitismo.
Finalizou sua participação recordando a cruz de Cristo, que também é a cruz de cada um de nós. Cruz que incomoda, machuca, e por isso queremos nos livrar dela. Frisa o Bispo, que nossa Igreja é a Igreja de um Cristo, sim ressuscitado, mas que antes foi crucificado. Não há ressurreição sem cruz. “Nas marcas do crucificado nós vemos as marcas da dor, que em seu gesto, transformaram-se em marcas de amor.” Jesus foi apaixonado pelo Evangelho. Será que nós, que optamos por segui-lo mais perfeitamente, temos as mesmas paixões? Partilhamos seus ideais até as últimas consequências? Estamos dispostos a suportar a via dolorosa, o calvário e a cruz ou queremos, em vez da coroa de espinhos, apenas a coroa da glória?
Frei Éderson Queiroz, OFMCap, presidente da CFFB nacional, iniciou sua reflexão no sábado dentro da temática do Retorno ao Evangelho: “Vinho novo em odres novos”, seguida da Santa Missa, também por ele presidida. Antes da Santa Missa, as atividades começaram às 8h30, com a oração conduzida pela Jufra.
Em suas palavras, Frei Éderson citou “os franciscanos como os grandes profetas diante das injustiças sociais do nosso tempo, sendo que a maior profecia, passa por uma vida de constante retorno às origens evangélicas”, como fez o Santo de Assis, inspiração de tantos homens e mulheres.
Durante a homilia, o celebrante fez um paralelo entre a liturgia do dia e os temas trabalhados, destacando que não somos discípulos de uma doutrina, de um compêndio, mas de uma pessoa, o Cristo. Uma paixão que nos impulsiona. O pai São Francisco foi “ferido” pelo amor a Jesus, fazendo-o centro de sua vida. A Eucaristia é um “perigo”, pois ao dizer amém, eu estou consentindo Cristo em mim, tornando-me um, com Cristo, nas minhas palavras, atitudes e gestos. “Que este encontro, possa despertar no nosso coração este desejo profundo pela pessoa de Jesus Cristo”, pediu.
Ainda no sábado à tarde, abordou o caminho do Pai Seráfico, de São Damião em direção a Santa Maria dos Anjos. Esta explanação trouxe três elementos do Evangelho que falaram diretamente ao coração daquele jovem sedento por viver a Boa Nova de Cristo: Ide (envio); Não levem nada (pobreza); a todos anunciai a paz (anúncio), lembrando assim que “pela fraternidade, Francisco conheceu o Evangelho; e, pelo Evangelho, entendeu a fraternidade”.
Citou ainda a presença fundamental de Santa Clara como a forma feminina de se viver o Evangelho pelos passos de São Francisco. Clara, jovem dotada de uma coragem ímpar, deixou tudo para trás, lançando-se num caminho sem volta, permitindo-se inebriar pelo semblante de Deus no rosto dos pobres, um Deus que se revela no despojamento.
Frei Éderson terminou com a Evangelii Gaudium, Exortação Apostólica do Papa Francisco, sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual, lançada em 24 de novembro de 2013, exibindo um vídeo elaborado por ocasião do mesmo. Concluiu com a mensagem de que a essência da vida franciscana passa pela reconstrução, pelo retorno às origens. É preciso dar passos no sentido desta restauração profunda dos caminhos que conduzem à Boa Nova de Cristo, só assim poderemos ser odres novos para o vinho novo.
Ao final do encontro, no domingo, todos os presentes dirigiram-se à Paróquia de Bom Jesus dos Perdões onde participaram da Santa Missa presidida pelo Visitador Geral, Frei Miguel Kleinhans, que, na homilia sobre o Bom Pastor, bem explicitou a importância daqueles que, como os religiosos e religiosas, dedicam suas vidas a bem cuidar do redil do Senhor. Mencionou a doação, gratuita e sincera, a preocupação explicitada na presença, no cuidado, no trabalho com as ovelhas, chamando a cada uma pelo nome. Tal relação gera confiança e faz com que todo o rebanho o reconheça pela voz, diferenciando sua voz de outras vozes. Disse que todos nós devemos, dia a dia, aproximarmo-nos mais e mais deste modelo de seguimento demonstrado pela Boa Nova de Cristo, tão bem vivida por São Francisco e Santa Clara, verdadeiras luzes à guiar nossa caminhada.
Fonte: http://franciscanos.org.br/?p=157630