Uma vida de doação: conheça a missão das Irmãs Franciscanas da Imaculada na periferia de Salvador

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Congregação das Irmãs Franciscanas da Imaculada fica em Águas Claras, região periférica de Salvador | Bnews – Divulgação Divulgação / Irmãs Franciscanas da Imaculada

O dia amanhece bem cedo em Águas Claras, periferia de Salvador, para as Irmãs Franciscanas da Imaculada. O sino toca, pontualmente, às 4h50, ecoando pelas áreas internas do convento e, antes do nascer do sol, Irmã Aguinólia Rosa (Irmã Noli), 52, desperta em sua modesta clausura (quarto), para encarar a realidade adversa da região. Ela levanta da cama, faz o sinal da cruz seguida pela oração pessoal, põe as vestes e o hábito cinza acompanhado de um longo cordão branco de três nós – que fica situado em sua cintura -, e calça uma sandália de couro, símbolo de São Francisco de Assis, santo católico patrono da sua espiritualidade, lembrado pela radicalidade em doar a vida a serviço das pessoas pobres e mais necessitadas.

Do quarto, segue à capela ao encontro das outras irmãs – o convento conta, atualmente, com seis irmãs: Irmã Noli, Irmã Cida, Irmã Rosária, Irmã Sineide, Irmã Neia e Irmã Kiara -, para uma reza comunitária, seguindo para a meditação, as preces e a oração do terço, pedindo a Deus forças para todo o dia que está por vir. Depois, cada uma se direciona para a sua função.

O bairro de Águas Claras está localizado às margens da BR-324, próximo ao limite de Salvador com Simões Filho, na região metropolitana. Contudo, enfrenta desafios sociais comuns a muitas zonas periféricas de Salvador, como a carência de infraestrutura e recursos básicos. Nesses 40 anos no bairro, as freiras já realizaram, junto com as famílias, ações de busca por soluções habitacionais, apoio psicológico, auxílio na inserção no mercado de trabalho, pagamentos de contas de energia, de água, compra de gás, além do acolhimento de crianças em situação de abandono ou abuso. Assim, elas atuam enfrentando diversas frentes para oferecer apoio e amparo.

Uma das muitas realidades enfrentadas pelas Irmãs Franciscanas da Imaculada foi o de Diana Miranda, de 39 anos, moradora de Águas Claras. A jovem passou por um momento difícil após viver um relacionamento marcado por violência emocional e psicológica, que culminou em uma gravidez acompanhada por crises de ansiedade e depressão pós-parto.

Diante das dificuldades, Diana recorreu ao apoio das Irmãs, que a acolheram com empatia, oferecendo suporte tanto a ela quanto à sua filha. “As irmãs na minha vida é um divisor de águas, como para a vida de tantas outras pessoas. No momento mais crítico da minha vida, eu fui acolhida por elas”, lembrou Diana, mãe de Maria Alice, que tem, atualmente, 5 anos.

“Elas têm um legado de perseverança, acolhida, humanidade, compreensão, ajuda mútua e principalmente amor à causa do pobre, à causa do outro. Se colocam diante das dificuldades do outro, não como julgador, não como juiz, mas sim como irmãs que acolhem, que ajudam a moldar, a melhorar a forma de interpretar a vida e a torná-la um pouco melhor”, continuou a jovem.

Já Camila Lopes, atualmente com 25 anos, foi uma das crianças do bairro acolhidas pelas Irmãs. Hoje, a filha dela, Isabella Pereira dos Santos, de 6 anos, é quem aproveita os projetos sociais que são oferecidos. “Tem muita coisa que a gente que mora na periferia não conhece, como o teatro e apresentações de música, de flautas, de capoeira. Se vê muita criminalidade por aqui, mas elas vieram para mostrar que existe o outro lado”, reconheceu Camila.

“Nunca faltaram brinquedos em dias das crianças, em Natal, em festas juninas e mais comemorações. Se a gente pudesse ajudar, ajudava. Se não pudesse, não ficava de fora. Nunca nenhuma criança ficou sem presente ou sem ir para as festas”, continuou.

Camila destacou que as Irmãs sempre estão disponíveis para apoiá-los e dar suportes em momentos pessoais e familiares. “Sempre que eu preciso, elas ajudam. Eu tive um pai doente, com câncer e elas deram todo o suporte sobre alimentação e remédios, nunca deixaram faltar nada. Elas nunca falam não. Sempre que a gente precisar de ajuda, elas sempre estão ali para nos ajudar”, lembrou.

As irmãs auxiliam também em diversos problemas sociais acarretados pelo bairro, envolvendo a criminalidade, o tráfico de drogas, ameaças, abusos, dentre outros, e acolhe a todos sem distinção. Diana avalia: “No nosso bairro, a cada dia que passa, os jovens se perdem em valores, ideais e propósitos, e até mesmo na fé de que há caminhos melhores. E vendo as irmãs em um ambiente totalmente distorcido do que as pessoas imaginam da vida religiosa, que não é apenas rezando ou dentro da igreja, mas em um cenário servindo no emocional de cada pessoa, com cada gesto, em cada acolhida, ou até mesmo na escuta, torna a vida melhor. A presença delas é como se fosse um farol mediante a uma escuridão”, descreveu.

A Congregação das Irmãs Franciscanas da Imaculada surgiu na Itália em 1876. Com a realidade precária em Salvador e a necessidade por ajuda, duas Irmãs Missionárias,

Clélia e Idelfonsa, partiram do porto de Gênova para a Bahia em 14 de Julho de 1972 do porto de Gênova para a Bahia. A princípio, ficaram na Capelinha, no São Caetano. Em 26 de janeiro de 1985, passaram a residir em Águas Claras.

O trabalho social no bairro ganhou força ao longo do tempo, com a ampliação de iniciativas voltadas à infância em situação de vulnerabilidade. A criação da escola São Damião no convento e da creche Irmã Guilhermina, a 650 metros do convento, marcou a consolidação de ações que buscavam oferecer acolhimento e um olhar mais humanizado para as necessidades das populações mais carentes.

Irmã Noli tem como missão cuidar da parte educacional. Ela fica responsável pela creche Irmã Guilhermina, que contém, atualmente, 100 crianças cadastradas entre dois a seis anos, de famílias que possuem baixa renda. “Assim que eu vim para o convento, fui logo ser professora. Nós vivemos, sobretudo, a dimensão da vida de oração e da vida de serviço, de gratuidade, de alegria, de disponibilidade, daquilo que o outro precisa e do acolhimento que chega até nós”, disse.

A congregação articula e promove, em parceria com outras entidades, projetos e serviços que favoreçam, para as crianças, o desenvolvimento de múltiplas habilidades, através de eventos socioculturais, aulas de iniciação musical, funcional kids (psicomotricidade), aulas de capoeira, biblioteca comunitária, curso de inglês etc. As crianças, geralmente, ficam na creche por tempo integral, das 8hrs às 16h30, recebendo o ensino infantil além de cuidados com higiene pessoal e três refeições: café, almoço e merenda. Talvez as únicas refeições que terão durante o dia.

Irmã Noli divide o tempo visitando os familiares dos alunos, para entender um pouco da realidade e as necessidades de cada um, para assim, poder estar auxiliando. Apesar dos desafios enfrentados ao longo dos anos, a freira reforça que frequenta qualquer localidade que seja necessária no bairro, ressaltando que recebe muito respeito por parte de todos os envolvidos.

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