A atuação das irmãs na Santa Casa de Piracicaba foi relembrada pela diretoria do hospital com documentos e fotos que contam a história dos 170 anos de fundação da entidade. Presentes no local desde 1911, a participação das freiras passou por diversos momentos importantes dentro da instituição, desde a mudança das irmãs dominicanas portuguesas pelas franciscanas brasileiras, passando pela construção da capela, a rotina religiosa e administrativa do hospital.
Eleito provedor da Santa Casa de Piracicaba em 31 de janeiro de 1915, Oscarlino Dias teve como uma de suas primeiras ações anunciar a substituição das irmãs dominicanas portuguesas, que atuavam no hospital desde 1911, pelas irmãs franciscanas, brasileiras. O contrato entre a Santa Casa e a Congregação das Irmãs Franciscanas do Coração de Maria, de Campinas,foi firmado em 1º de agosto de 1915, transferindo às irmãs a direção interna do Hospital, sob a responsabilidade de uma superiora, que tinha plena autonomia no exercício de suas funções.
A saída das irmãs dominicanas aconteceu no dia 31 de julho, dia em que chegaram as irmãs Beatriz do Coração de Maria, Clara Maria da Santa Face e Rita Maria de Cássia, acompanhadas pela irmã Ignez Meneghetti, superiora geral das irmãs franciscanas. Cinco dias depois, chegariam as irmãs Escolástica e Rosa Maria do Coração de Jesus, nomeada madre superiora da Santa Casa, cargo que, em 1918, passaria a ser ocupado pela Madre Canuta Maria de Assis.
As irmãs, que deveriam atuar em número mínimo de seis, poderiam ser substituídas a qualquer momento pela superiora. Pelo contrato, quando enfermas, elas seriam tratadas gratuitamente no próprio Hospital, onde teriam também um dormitório especial, duas saletas para suas refeições e trabalhos de costuras entre outros afazeres.
Além da residência, sustento, luz e roupa lavada, cada irmã recebia, a título de gratificação mensal, a quantia de 40$000 réis, entregues à superiora, que detinha também a prerrogativa de demitir e nomear os empregados, bem como supervisionar os serviços das enfermarias, banheiros, cozinha, lavanderia e as atividades relacionadas aos serviços econômico-administrativos e ao cumprimento do Regimento Interno do Hospital.
Eram as irmãs também as responsáveis pelas visitas diárias ao Hospício Barão da Serra Negra, encarregando-se de sua direção interna, sem assumirem, no entanto, a obrigação de tratar dos alienados. Elas fiscalizavam o fornecimento de alimentos e materiais feitos para servir ao Hospital, ao Hospício e ao Asilo de São Lázaro.
O Livro Tombo da Congregação Franciscana revela que, além dos serviços administrativos e de Enfermagem, as irmãs eram responsáveis ainda pela organização dos compromissos religiosos, como missas, retiros espirituais, trabalhos de catequese, visitas canônicas e conferências, realizadas pelos freis. Cabia a elas também“o dever nobre de ensinar o catecismo aos pobres doentes fazendo-os compreender o modo de se confessarem e o tempo da ação de graças depois da Santa Comunhão e até mesmo determinar-lhes um número certo de orações para esse exercício”.
Além da retaguarda ao atendimento às necessidades físicas dos doentes, havia uma preocupação também com o preparo espiritual das irmãs que atuavam junto aos pacientes e, em uma das cláusulas do contrato, a Santa Casa se comprometia em manter a Capela para o livre exercício do culto catholico, sendo capellão um padre Capuchinho, ao qual era dada uma mensalidade de 50$000 para sua condução.
As primeiras irmãs enfermeiras da Santa Casa de Piracicaba formaram-se em Sorocaba, no Curso de Enfermagem ministrado junto ao hospital da cidade. A instituição abrigava à época as irmãs que prestavam serviços àquela comunidade e, também, irmãs estudantes de outras cidades. O Curso era custeado pela própria Congregação ou pelas Santas Casas de Misericórdia em que trabalhavam.
Sob o comando das irmãs franciscanas, o movimento religioso na Capela começou a aumentar e, em 1926, foram registradas 118 missas, 2.931 comunhões, 19 práticas, 21 viáticos, 10 bênçãos, quatro casamentos, 29 encomendações e seis batizados. Em 1928, a Congregação passou a realizar conferências, extrema unção e a formar o primeiro grupo de primeira comunhão, com 31 participantes.
Naquela época, a direção da Santa Casa estava a cargo da madre superiora Noemia Maria da Eucaristia e as irmãs franciscanas do Coração de Maria sofreram uma dura perda, aos 6 de setembro de 1950, quando faleceu Mamãe Cecília, fundadora da Congregação, substituída em 1952 pela madre Elisabete Maria da Santíssima Trindade.
Em 1962, a Irmandade inauguraria também a nova Clausura, com nove quartos, sala de estar e sanitários individuais, resolvendo o problema de moradia das irmãs franciscanas que trabalhavam no Hospital. Foi quando as irmãs passaram a se atualizar, através de cursos de especialização em Enfermagem e em Pedagogia na Universidade Católica de Campinas.
Em novembro de 1965, o provedor Waldomiro Perissinotto concluía sua gestão, reforçando a necessidade de se construir uma nova Clausura que comportasse as 12 irmãs franciscanas, já que a atual possuía apenas nove quartos. Em seu Relatório de Atividades, relacionou as obras de ampliações, acabamentos e conservação da Santa Casa e instalação de Berçário para prematuros na Maternidade, ocasião em que inaugurou, em 31 de julho, o quadro de Mamãe Cecília em homenagem ao cinquentenário das irmãs franciscanas no Hospital. Três anos depois, já na gestão do provedor Francisco Munhoz, as irmãs desfrutariam também do conforto e benefícios de uma nova capela no Hospital, inaugurada em 1968.
Outra evidência que se acentuou a partir do início da década de 70, foi a gradativa redução do número e das funções das irmãs dentro da Instituição. Depois de assumirem a responsabilidade pela administração geral do Hospital a partir de 1915, cuidando, sobretudo, das enfermarias, as irmãs acabaram compartilhando espaço com profissionais especializados em administração hospitalar e enfermeiras graduadas, já que, no início, apenas a madre superiora tinha o Curso de Enfermagem.
Na verdade, a Instituição buscava a especialização profissional em todos os níveis e a redução das prerrogativas das irmãs na Santa Casa parece coincidir com a instalação de uma Escola de Enfermagem na cidadee com a descentralização dos serviços administrativos, por intermédio da contratação de secretário executivo da Provedoria.
Em novembro de 1971, a Irmandade sentia os reflexos da nova situação que se instalava e alertava para a necessidade de contratação de parteiras de alto padrão, devido à redução no número de irmãs que prestavam o serviço. Em janeiro de 1972, depois de estudar um organograma administrativo para o Hospital, a Mesa Administrativa reuniu-se com as 14 freiras da Irmandade para discutir a admissão de um administrador e divisão dos setores burocráticos, criando-se os Departamentos de Tesouraria e Contabilidade.
Naquele mesmo ano, assumia o cargo de superiora das irmãs da Santa Casa Madre Maria Conceição Aparecida, função desempenhada a partir de 1974 por Madre Angela Piccolo, época em que as irmãs Alice Vaccari e Ana Neuza Bobato participam de reunião em Campinas para avaliar o processo de implantação da Pastoral da Saúde em hospitais sob a coordenação das irmãs e atualmente exercida pela Irmã Davina Bernardi.
Enquanto isso, por orientação do comendador Romano, foram organizadas reuniões mensais com as irmãs responsáveis pelos diversos setores da Santa Casa e, em 1981, a coordenação do serviço de Enfermagem passou a ser exercida por uma equipe de três membros, sendo duas enfermeiras e uma irmã franciscana. A modalidade de serviços das irmãs também sofreria alterações no ano seguinte, quando a aplicação do regime CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas resultou num novo contrato e na mudança das irmãs, que deixariam de residir no Hospital.
Em junho de 1983, as irmãs passaram a ocupar as dependências do imóvel de propriedade dos padres capuchinhos, cedido temporariamente à Congregação até 1989, época em que elas voltaram a residir na Santa Casa até 23 junho 1991, quando foram concedidas as bênçãos à residência definitiva das irmãs, na avenida Independência, 878.
Em novembro de 2000, por iniciativa do então vereador João Amaurício Pauli, a Irmandade comemorou o centenário de fundação da Congregação das Irmãs Franciscanas do Coração de Maria, instituída na cidade pela piracicabana Madre Cecília, que também atuou na Santa Casa.