Escutar o próximo: um desafio frente ao individualismo

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O Papa Francisco, por conta do 56º Dia Mundial das Comunicações Sociais, nos coloca a reflexão através do texto “Escutar com o ouvido do coração”, onde analisa a dimensão na escuta em tempos de redes sociais e a sua importância no processo sinodal da Igreja.

Em tempos em que o ser humano é descartável, vivemos relações que só visam o lucro. Francisco, na Laudato Si’ apresenta a preocupação com o modo de como a humanidade vive hoje sob o poder tecnológico; e o ser humano se tornou um mero objeto a ser possuído, dominado e consumido pelo poder (LS, 106).

Hoje, com o avanço dos meios de comunicação, estamos sendo bombardeados de todos os lados com notícias, comentários, podcasts e diversos tipos de comunicação. Entretanto, é preciso parar e escutar com atenção, com o ouvido do coração, o outro e sua dor, suas fraquezas e mazelas.

Em sua carta, Francisco afirma que “entre os cinco sentidos, parece que Deus privilegie precisamente o ouvido, talvez por ser menos invasivo, mais discreto do que a visão, deixando consequentemente mais livre o ser humano. A escuta corresponde ao estilo humilde de Deus. Ela permite a Deus revelar-Se como Aquele que, falando, cria o homem à sua imagem e, ouvindo-o, reconhece-o como seu interlocutor. Deus ama o homem: por isso lhe dirige a Palavra, por isso «inclina o ouvido» para o escutar.”

Francisco é enfático ao afirmar que: “Assim temos, por um lado, Deus que sempre Se revela comunicando-Se livremente, e, por outro, o homem, a quem é pedido para sintonizar-se, colocar-se à escuta. O Senhor chama explicitamente o homem a uma aliança de amor, para que possa tornar-se plenamente aquilo que é: imagem e semelhança de Deus na sua capacidade de ouvir, acolher, dar espaço ao outro. No fundo, a escuta é uma dimensão do amor”.

Por isso é necessário, cada vez mais, escutar o outro, suas necessidades, seus desejos e acima de tudo, respeitar. Francisco corrobora com seu pensamento ao manifestar que “a escuta é o primeiro e indispensável ingrediente do diálogo e da boa comunicação”. Por isso Deus se propõe a escutar a todos, coloca-se em nossa condição para compreender cada fase e contexto de nossa vida.

Infelizmente, o ser humano não se coloca a escutar, somente deseja falar sem dar atenção àquilo que mais necessita. O ser humano se tornou mais uma mercadoria a ser utilizada e descartada. Com a atual cultura do descartável, como nos apresenta o Papa Francisco, há uma tendência a tornar a vida humana como “parte do negócio”, algo que se pode barganhar.

Desta maneira, o Papa nos apresenta a necessidade de escutar a sociedade e afirma que é a condição mais necessária, principalmente em tempos tão difíceis e obscuros. “É preciso inclinar o ouvido e escutar em profundidade, sobretudo o mal-estar social agravado pelo abrandamento ou cessação de muitas atividades econômicas”.

Assim, com a confiança de sermos autênticos servidores e colaboradores do Reino devemos abrir nossos ouvidos dentro da Igreja. Francisco recorda que estamos em processo sinodal: “Recentemente deu-se início a um processo sinodal. Rezemos para que seja uma grande ocasião de escuta recíproca. Com efeito, a comunhão não é o resultado de estratégias e programas, mas edifica-se na escuta mútua entre irmãos e irmãs. Como num coro, a unidade requer, não a uniformidade, a monotonia, mas a pluralidade e variedade das vozes, a polifonia”.

O Papa conclui a mensagem analisando a dimensão da escuta dentro da Igreja. “Quem não sabe escutar o irmão, bem depressa deixará de ser capaz de escutar o próprio Deus.” Nesta proposta é preciso descobrir uma “Igreja sinfônica, na qual cada um é capaz de cantar com a própria voz, acolhendo como dom as dos outros, para manifestar a harmonia do conjunto que o Espírito Santo compõe”.

Por isso, é necessário mudar! É preciso olhar para a forma como tratamos e escutamos a cada um. Devemos traçar um caminho ético pautado no zelo e no cuidado com o próximo, pautado no bem comum e preocupação com os mais frágeis da sociedade. Jesus, com seu exemplo, nos mostra a realidade e como escutar de forma ética, além de nos propor refletir nossas ações diante dos que necessitam.

Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves é mestre em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), em BH, professor de teologia no Instituto Teológico Franciscano (ITF), em Petrópolis (RJ) e membro do Conselho Regional de Formação (CRF) – LESTE II do CNLB.

Fonte: Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil

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