Reflexão: Oração à Terra ferida, nossa grande e generosa Mãe

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Vivemos sob a Covid-19 tempos dramáticos que, como um manto de sofrimento e de tristeza, estende-se sobre toda a humanidade. A doença e a morte quase foram naturalizadas em nosso país, dada a contaminação de milhões de pessoas e mais de 133 mil foram já vitimadas, deixando famílias, parentes e amigos em profunda prostração por não poderem se despedir, fazer o ritual do velório e o viver o imprescindível luto.
Neste contexto temos que rezar à nossa boa e generosa Mãe Terra para que tenha piedade de nós, seus filhos e filhas, apesar de todas as ofensas e agressões que por séculos lhe temos inflingido. Ela não é vingativa. Mas nos dá severas lições, como agora com o coronavírus, para aprendermos um outro modo de habitar a Casa Comum, para nos relacionarmos com cuidado, respeito e veneração para com ela, nossa Magna Mater, Grande Mãe, Pacha Mama e Gaia.

Nesse espírito de súplica humilde e com os olhos marejados de lágrimas que fiz esta oração:

“Terra minha querida, Grande Mãe e Casa Comum! Vieste nascendo lentamente, há milhões e milhões de anos, grávida de energias criadoras.

Teu corpo, feito de pó cósmico, era uma semente no ventre das grandes estrelas vermelhas que depois explodiram, te lançando pelo espaço ilimitado.

Vieste aninhar-te, como embrião, no seio de uma estrela ancestral, no interior da Via-Láctea, transformada depois em Super Nova. Ela também sucumbiu de tanto esplendor. Era o primeiro Sol.

E vieste então parar no seio acolhedor de uma Nebulosa, onde já, menina crescida, perambulavas em busca de um lar. E a Nebulosa se adensou virando o nosso Sol, esplêndido de luz e de calor.

Ele se enamorou de ti, te atraiu e te quis em sua casa, junto com Marte, Mercúrio, Vênus e outros filhos e filhas, os planetas. E celebrou o esponsal contigo. De teu matrimônio com o Sol, nasceram filhos e filhas, frutos de tua ilimitada fecundidade, desde os mais pequenininhos, bactérias, vírus e fungos até os maiores e mais complexos seres vivos. E como expressão nobre da história da vida, nos geraste a nós, homens e mulheres com inteligência, amorosidade, solidariedade, veneração e cuidado.

Através de nós, tu, Terra querida, sentes, pensas, amas, falas e veneras. E através de nossos olhos contemplas o céu estrelado onde estão tuas irmãs e teus irmãos. E continuas crescendo, embora adulta, para dentro do universo rumo ao Grande Atrator que outro não é senão o Seio do Deus-Pai-e-Mãe de infinita ternura. Dele viemos e para ele retornamos com uma implenitude que só Ele pode preencher. Queremos, ó Deus, Pai e Mãe de bondade, mergulhar em Ti e estar em eterna comunhão de amor contigo para sempre junto com a Mãe Terra.

E agora, Terra querida, pensando em todos os sofredores do mundo afetados pela Covid-19, realizo o gesto de Jesus na força de seu Espírito. Como ele, cheio de unção, te tomo em minhas mãos impuras, para pronunciar sobre ti a Palavra sagrada que o universo escondia e tu ansiavas por ouvir:

“Hoc est corpus meum: Isto é o meu corpo. Hoc est sanguis meus: Isto é o meu sangue” E então senti: o que era Terra se transformou em Paraíso e o que era vida humana se transfigurou em vida divina. O que era pão se fez corpo de Deus e o que era vinho se fez sangue sagrado.

Finalmente, Terra, com teus filhos e filhas chegaste em Deus. Te fizeste divina por participação. Enfim em casa.

“Fazei isso em minha memória“. Por isso, de tempos em tempos, especialmente neste momento em que todos teus filhos e filhas sofrem sob a ação perigosa da Covid-19, cumpro o mandato do Senhor. Pronuncio a palavra essencial sobre ti, Mãe querida, e sobre todo o universo. E junto com ele e contigo nos sentimos o Corpo de Deus, no pleno esplendor de sua glória. Amém, amém, Aleluia”.


Leonardo Boff é ecoteólogo e escritor e escreveu: “O parto doloroso da Mãe Terra: a nova etapa da Terra e da Humanidade” a sair no final do ano pela Vozes e a sair em breve: “O Covid-19: um contra-ataque da Terra à Humanidade” também pela Vozes.

Fonte: Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil

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