À frente de uma das unidades de ensino mais tradicionais da cidade

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Rita de Cássia Saturno é formada em Pedagogia com especialização em administração escolar. Trabalha na rede de ensino há 37 anos. Iniciou os trabalhos em sala de aula no ano de 1985, numa turma de 3º ano de Supletivo, o que corresponderia hoje ao Ensino de Jovens e Adultos (EJA). Está na direção de ensino do Instituto Baroneza de Rezende há seis anos. Anteriormente, era professora da educação infantil, cargo que adquiriu em 2016.

Nesta entrevista ao Persona, Rita fala sobre o centenário do Instituto Baroneza de Rezende, uma das escolas mais tradicionais de Piracicaba, comemorado neste mês.

Quando a escola foi inaugurada e em que contexto? Pode nos contar um pouco mais sobre esses 100 anos de tradição?

A história do Instituto Baroneza de Rezende está diretamente relacionada a história de uma importante instituição religiosa: a Congregação das Irmãs Franciscanas da Imaculada Conceição, fundada em 1843, na Áustria por Madre Francisca Lampel.

Em janeiro de 1922, veio um pedido oficial para as irmãs da Casa Mãe (Áustria). Era a Dona Lydia de Souza Resende (filha dos barões de Rezende) que em viagem na Suíça e França, conheceu as escolas de serviços domésticos e desejava introduzi-las em nossa pátria. Em contato com padre Estevão, dona Lydia soube das irmãs e de sua vontade de aceitarem o convite de virem ao Brasil.

A fundação da escola é a realização de dois sonhos: o de Dona Lydia Rezende, de ter uma escola especial para as mulheres empreendedoras de Piracicaba e o de Madre Batista Minks e as cinco primeiras irmãs a chegarem no Brasil, de serem missionárias, Irmã Maria Geralda Urschler, Irmã Maria Adolfina Lubertz, Irmã Maria Edmunda Baier e Irmã Maria Leocádia Scheucher.

Madre Joana Batista Minks, aos 66 anos de idade, foi a primeira a se dispor e, com muita alegria, aceitou o chamado de Deus para essa desafiadora missão.

É interessante lembrar que, quando falamos de uma escola para mulheres, que ensinava a bordar, cozinhar, costurar e datilografar não estamos falando somente em donas de casa, mas em mulheres livres e empreendedoras, podendo assumir o casamento e/ou permanecerem solteiras, sem depender da decisão ou recursos de terceiros para sobreviver (maridos, heranças), uma vez que a própria Dona Lydia era solteira.

Dona Lydia, almejando realizar este sonho, trouxe o modelo austríaco de educação, por meio das irmãs franciscanas, para Piracicaba, fundando juntas o Instituto Baroneza de Rezende, em homenagem à mãe de Dona Lydia, Dona Anna Cândida da Conceição Rezende.

A escola foi fundada em 19 de março de 1922, quando os barões de Rezende ofereceram para as irmãs uma casa localizada na Vila Rezende (onde é hoje o Instituto Baroneza de Rezende), num contexto histórico e cultural muito rico para a sociedade brasileira, também conhecido como o ano da Arte Moderna e Centenário da Independência.

Até a segunda grande guerra mundial, muitas irmãs vieram da Áustria para o Brasil. As vocações foram surgindo aqui e, aos poucos, conforme o seu carisma fundacional, as irmãs foram assumindo novos trabalhos, em outras cidades e estados do nosso país.

Hoje, estão presentes em três estados do Brasil: São Paulo, nas cidades de Piracicaba, Araraquara, São Paulo capital, Catanduva e Ibaté, em Santa Catarina, na cidade de Gaspar e em Minas Gerais, na cidade de Araxá.

Todavia, as mudanças que se operam na sociedade não pedem licença para acontecer. Mudam-se os valores morais e sociais; as estruturas familiares vão se alterando, sendo necessário enfrentar as dificuldades econômicas, que nos são impostas. E a escola, sobretudo, deve estar preparada para essas mudanças. Assim, tornou-se necessário mudar o sistema da Escola de Economia Doméstica, porque a clientela à qual sempre procurou atender também se transformava rapidamente. Era preciso buscar novas soluções para os problemas financeiros vividos pelas irmãs, então denominadas Irmãs Franciscanas da Imaculada Conceição (FIC). Para manter a escola, elas firmaram uma parceria com o SESI – Serviço Social da Indústria.

Desse modo, em 1962, o Centro Educacional SESI 085 se instalava no prédio da Av. Barão de Serra Negra e ali permaneceria por trinta e dois anos, dirigido pela Ir. Regina Beltrame, com a mesma filosofia franciscana, trazida em 1922.

Em 1994, a parceria entre SESI e Irmãs Franciscanas se desfez, pois o Centro Educacional se transferiu para sua sede própria. Mais uma vez, o espírito empreendedor das irmãs se manifesta e no ano seguinte, em 1995, inicia-se o curso de ensino fundamental conjuntamente à pré-escola já existente, mantido agora pela Sociedade de Educação e Promoção Social Imaculada Conceição (SEPROSIC), que até hoje mantém uma história que se resume em muito trabalho; fundamentado na pedagogia franciscana que prepara seus alunos para serem cidadãos aptos para a vida moderna, sem se afastarem do amor a Deus e ao próximo.

Frente aos desafios da sociedade contemporânea, em 2008, atendendo aos pedidos da comunidade escolar, o Instituto Baroneza de Rezende inicia o curso de Ensino Médio, gradativamente, e hoje conta com uma sala de cada série, atendendo, portanto, à Educação Infantil, ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio.

Celebrar 100 anos é se dar ao luxo da maturidade seletiva. Temos a honra de lembrar com saudades os bons momentos e agradecer a Deus a graça de ter vencido, mesmo em meio às dificuldades, os momentos difíceis.

Como é essa metodologia de ensino da escola?

A metodologia é sociointeracionista e procura alinhar o que há de mais moderno e tradicional em termos de educação, sempre ligado aos valores franciscanos, buscando a formação integral de nossas crianças e adolescentes.

O Instituto Baroneza de Rezende procura desenvolver uma pedagogia integral e participativa, apoiada numa abordagem dialética, na qual o ser humano só se modifica na relação com o outro e, ao mesmo tempo, modifica o outro.

Dois teóricos se destacam como principais colaboradores na fundamentação de nosso projeto: Jean Piaget e Lev Semenovich Vygotsky.

Nestes anos todos de história de nossa escola, quais foram, em sua opinião, as maiores realizações, tanto no campo de construção (parte física), como no campo pedagógico?

Na minha opinião um fato que me chamou muito a atenção é que a escola foi inaugurada como doméstica, com foco na formação feminina e no mesmo ano, em junho 1922, iniciou a Educação Infantil. A Educação não pode ser fragmentada. Ao Educar, educamos! Em poucos meses as irmãs perceberam que não adianta educar os adultos, sem antes educar as crianças.

A educação é um processo contínuo. A escola evoluiu aos poucos, de uma única casa de veraneio até tomar praticamente todo o quarteirão onde está localizada. Cada prédio aumentado, cada laboratório, quadra e ginásio esportivo construídos foram fruto da evolução e investimentos constantes.

A escola passou por inúmeros desafios, sempre atendeu a educação infantil, abrigou por quase trinta anos a escola de número 85 do SESI, voltou a ser particular com o ensino fundamental até expandir para o ensino médio em 2008, alcançando excelentes níveis de aprovação nas principais universidades do país.

Quais foram seus maiores desafios enquanto diretora do Instituto?

Fazer uma educação de qualidade, se inovar todos os dias, numa estrutura e tradição de 100 anos é muito desafiador, mas a Pandemia foi sem dúvida o grande desafio para todos. Foi uma loucura organizar a escola, formar a equipe, convencer-me e convencer os professores que há outras formas eficazes de fazer educação.

Tem algum caso interessante que aconteceu nestes anos que a senhora é diretora da escola que a tenha marcado?

O fato mais interessante e desafiador, sem dúvida nenhuma, foi ver a escola se reestruturar completamente de maneira digital no cenário da pandemia que se estabeleceu nos últimos dois anos. Ver o empenho de cada professor, de cada colaborador em manter a qualidade de educação e proporcionar um ambiente sadio e seguro, ainda que digital, para nossos alunos foi uma das maiores conquistas que pudemos realizar enquanto instituição escolar. Perceber o apoio e o incentivo de cada família, desde as primeiras reuniões remotas, e caminharmos juntos durante estes tempos tão difíceis foi muito animador, deixando ainda mais claro um termo que utilizamos constantemente, que é a Família Baroneza sendo concretizada dia a dia.

Como você vê a educação infantil, fundamental e médio atualmente na escola?

Eu sempre vejo a educação com bons olhos: A Educação Infantil é a porta de entrada para todos os grandes acontecimentos da vida da criança, da família e da escola. Em poucos meses eles adquirem o modo de ser da escola. Os alunos do Fundamental I (1º ao 5º ano), são muito animados, sabem as normas, conhecem os professores, todas as dependências e dinâmicas da escola, brincam muito e aproveitam ao máximo todos os minutos dentro da escola. Os alunos do Fundamental II são mais calmos e aprendem rapidamente a dinâmica de estudo mais compactado em hora aula. Aos poucos vão adquirindo autonomia nos estudos, no cuidado com suas coisas e consigo mesmo. No Ensino Médio eles são muito divertidos, levam o estudo muito a sério, conhecem de maneira mais profunda os professores, interagem melhor com os colegas, professores e funcionários. Estão muito focados nos resultados de ENEM e Vestibular, como consequência de todo esforço e dedicação aos estudos durante os vários anos de sua vida.

Ocorre crescimento pela procura para matricular de alunos, bem como de funcionários?

Todos os anos, graças ao bom trabalho desenvolvido na escola, há ingresso de novos alunos em todas as séries e uma excelente permanência dos que já estão. Mesmo em meio a muitas dificuldades sociais e financeiras ocorrida pela pandemia a escola manteve seu número médio de alunos. Quanto aos funcionários a rotatividade é pequena. A maioria dos funcionários e professores são parceiros de longas datas… 10, 20 anos.

Como a educação pode melhorar o futuro da sociedade em que estamos inseridos?

Cumprindo o seu papel de formar cidadão pensantes, adultos independentes e felizes. Somos seres humanos e é assim que devemos ser e viver: a terra é grande e generosa, Todos os seus filhos devem ser tratados, acolhidos e amados da mesma forma.

Laís Seguin
lais.seguin@jpjornal.com.br

Fonte: Jornal de Piracicaba

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