Para quem lê o título de um livro chamado Francesco, il ribelle [Francisco, o rebelde], que é publicado agora, no fim de fevereiro, a poucos dias do quinto aniversário da eleição do Papa Francisco, a primeira coisa, instintiva, que vem à mente é que o texto fala precisamente sobre o pontífice argentino.
A reportagem é de Maria Antonietta Calabrò, publicada por L’HuffingtonPost.it, 27-02-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Dado que o autor é o Pe. Enzo Fortunato, do Sacro Convento de Assis, poder-se-ia imaginar uma obra sobre as semelhanças entre o Romano Pontífice e São Francisco.
Mas o texto é uma biografia nova e inédita justamente do Pobrezinho de Assis. Que os italianos quase não conhecem, já que o Santo da Úmbria não aparece sequer na maior parte dos livros didáticos obrigatórios, enquanto que, no passado, era quase uma figura central da identidade nacional, dada a influência na construção da língua italiana e nas principais obras-primas artísticas do país.
Capa do livro “Francesco, il ribelle”, do frei Enzo Fortunato, com prefácio do cardeal secretário de Estado, Pietro Parolin.
No entanto, basta esse fato – a publicação nas livrarias fora de sincronia com as celebrações da festa do calendário (4 de outubro) e a imediata proximidade com o aniversário da eleição do Papa Bergoglio – para gerar alguns paralelismos. Até porque, em seu prefácio, o secretário de Estado, Pietro Parolin, escreveu que seu livro, entre as tantas biografias até mesmo recentes de São Francisco, tem uma caracterização específica.
“Poder-se-ia dizer que se trata de uma leitura eclesial do santo de Assis.” Porque “não há dúvida de que [São] Francisco é, acima de tudo, um homem da Igreja, fiel ao papa, e que a Igreja Católica se depara constantemente com a herança evangélica do santo de Assis”.
Mas Parolin também acrescentou: “Como não ler em contraluz, nas páginas deste livro e na humanidade de Francisco de Assis, o projeto evangélico que o Papa Francisco está levando em frente para toda a Igreja?”.
Eis a entrevista.
Padre Enzo Fortunato, o senhor ficou surpreso?
Quando seu prefácio chegou, fiquei comovido. Certamente, o paralelismo com o Papa Francisco é, como diz Parolin, significativo. Eu digo isso nas conclusões: “Não é, talvez, o estilo do frade de Assis que o Papa Francisco está vivendo e propondo? É claro, as responsabilidades e as funções são diferentes. O primeiro é um membro da Igreja, e o segundo é um pastor, mas o objetivo é semelhante: seguir e viver as pegadas do Evangelho”.
O senhor foi um dos primeiros a desejar um papa de nome Francisco ainda antes da entrada dos cardeais no último conclave…
Sim, porque Francisco de Assis, a meu ver, era um caminho a percorrer para toda a Igreja, abalada pelos escândalos, para voltar a ser crente e credível…
Algo que lembra a visão do Papa Honório III, que viu em sonho o Santo pobrezinho que “sustenta” sobre si o grande palácio de Latrão, onde a cátedra papal tem sede…
Sim, São Francisco recebeu de Jesus Cristo justamente esta missão: “Vai e repara a minha Igreja”. Mas o caminho de São Francisco, a meu ver, também é o único caminho útil para a Igreja para retomar a relação com as pessoas debilitadas pela crise econômica, pelo hedonismo e pelos frutos amargos do egoísmo e do capital econômico.
O papa escreveu em um tuíte que, até mesmo para a prosperidade, é preciso que a bússola das pessoas marque o verdadeiro Norte, o Norte dos valores…
A bússola do papa é o Evangelho, sine glossa, assim como para o santo de Assis. O retorno ao essencial…
O secretário-geral da Conferência Episcopal Italiana disse que a Igreja está como que imobilizada pelo peso da gestão dos bens materiais e por isso está com dificuldades para ser “uma Igreja em saída”…
O retorno ao essencial significa abandonar o fardo que ameaça encalhar a missão da Igreja. Desse ponto de vista, São Francisco tinha três horizontes: a pobreza, precisamente, a paz – que é outro tema forte do atual pontificado – e o respeito e o diálogo com a Natureza.
A propósito da radicalidade evangélica de São Francisco, o senhor relata na biografia que o Santo explicava aos seus frades: “O Senhor me disse que queria que eu fosse um novo louco no mundo; esta é a ciência à qual Deus quer que nos dediquemos”. Mas como se pode ajudar no caminho das pessoas assim?
Acima de tudo, com a proximidade pastoral de estar ao lado, corpo a corpo, até mesmo com os lobos e os bandidos, fazer-se próximo. Segundo: com uma linguagem também próxima. A pregação de São Francisco era feita em língua vulgar, todos o entendiam. Terceiro: com lugares de proximidade onde se possa estar com o outro. Isso também serviria para a política.
Fonte: http://www.ihu.unisinos.br/576468-francisco-o-rebelde-o-santo-e-o-papa