Frente de Solidariedade: o que fazemos, como fazemos e o que queremos fazer…

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Os frades que atuam na Frente da Solidariedade com os Empobrecidos se reuniram remotamente nesta quinta-feira, 25 de março, para fazer uma avaliação do trabalho em tempo de pandemia, partilhar iniciativas de solidariedade na Província Franciscana da Imaculada Conceição, apresentar o Plano de Ação 2021 e refletir sobre o Plano de Evangelização tendo em vista o Capítulo Provincial no final do ano.

O Ministro Provincial, Frei César Külkamp, fez a saudação inicial e agradeceu a Frei Marx Rodrigues dos Reis, que assumiu há pouco tempo a coordenação da Frente de Solidariedade, por buscar essa articulação entre os confrades que estão mais envolvidos em ações ligadas à Frente. Também participaram desse encontro o Secretário da Evangelização e Vigário Provincial, Frei Gustavo Medella, e o Definidor Frei Alexandre Magno.

Segundo o Ministro Provincial, para além de uma Frente específica de trabalho, a solidariedade deve ser compreendida como uma dimensão transversal indispensável à missão franciscana: “É sempre um desafio animar para essa dimensão que é transversal. É uma dimensão assumida em nosso Plano de Evangelização, mas acredito que antes disso ela é evangélica, franciscana, cristã e deve estar presente em toda a nossa vida e em nossa ação. É nesse sentido buscaria um pensamento do Papa Francisco num dos seus pronunciamentos no Iraque, quando ele pegou uma frase da sua mensagem para o Dia Mundial da Paz deste ano em que ele fala que ‘a solidariedade nos ajuda a ver o outro’, e ele usou isso lá no contexto do Iraque porque a sociedade é, acima de tudo, uma organização. Ela se distingue por uma unidade de irmãos, uma unidade fraterna”, observou Frei César.

Segundo o Ministro Provincial, uma expressão da unidade fraterna é justamente a solidariedade. “E nós somos uma fraternidade por vocação, queremos abraçar esse convite do Papa Francisco para olhar para toda humanidade como irmã”, enfatizou, lembrando que na própria Carta Encíclica Fratelli tutti e, antes, na Laudato Si’, ele já dizia que não podemos separar esse sentimento de fraternidade tanto dos nossos irmãos, como do cuidado da natureza, especialmente dos mais pobres, e a necessidade de articular um trabalho que atenda a todas as pessoas, em especial aquelas mais vulneráveis. “Então, ele [o Papa] destaca a solidariedade como uma virtude que nos leva praticar gestos concretos de cuidado e de serviço. Nós temos um grande desafio, aqui falando como confrades e como Província, que é trazer esse sentimento de solidariedade como característico da fraternidade para nossas relações. Ou seja, fazer aquilo que o Papa Francisco nos pede para enxergar no outro. E esse enxergar significa assumir esta dimensão do cuidado e do serviço ao outro. Somente assim seremos verdadeiramente fraternidade na Província”, apontou. Para ele, “esta Frente deve ser um lugar de reflexão e articulação, de promoção de iniciativas que ajudem nesse cuidado, nesse serviço, a todos nossos irmãos”.

Frei César lembrou ainda que o coordenador dessa Frente é também o animador do serviço de Justiça, Paz e Integridade da Criação (JPIC). “Eu acredito que este serviço é muito maior e mais importante como missão, em termos de Ordem dos Frades Menores, do que a própria Frente. Aos poucos, talvez o próprio JPIC pudesse englobar toda essa Frente naquilo que ele tem de missão muito específica. Então, acho importante trazer esses elementos para pensarmos como, de fato, levar essa reflexão para toda a nossa Província, agora na preparação do Capítulo”, propôs o Ministro Provincial. Segundo ele, todos os frades são naturalmente agentes dessa Frente. “Por isso é que se fala mais vezes de ela, de fato, conseguir a reflexão e ação que atinjam todas as outras Frentes, a nossa formação inicial, a nossa formação permanente, e de ser a nossa grande característica”, disse.

“Então, desejo que esse seja um encontro profundo nesse sentido também de aproximação, de fraternidade, que é sempre solidária, uns com os outros, nesse tempo tão difícil que nós estamos vivendo. Estamos presenciando o sofrimento interno e também com o nosso povo. Que esta seja, portanto, uma reunião que nos ajude a crescer nessa sensibilidade para com o outro e a levarmos isso como grande sentimento da nossa fraternidade”, completou Frei César.

Para Frei Marx, que também é animador do JPIC, o encontro foi convocado a partir de duas propostas: apresentar o caminho percorrido no ano passado e pensar o futuro da Frente da Solidariedade, tendo em vista, principalmente, o Capítulo Provincial a ser realizado no final deste ano. Por conta da pandemia, avaliou Frei Marx, 2020 foi um ano difícil em todos os sentidos, mas também foi propício para a divulgação do carisma franciscano relacionado à solidariedade. “Cabe ressaltar que os freis que estavam ligados à Frente estiveram intimamente ligados ao SEFRAS (Serviço Franciscano de Solidariedade), o que gerou uma grande demanda de trabalho e atividades”, especialmente na Tenda Franciscana em São Paulo e no Rio de Janeiro. “Fomos procurados por muitas instituições”, disse. Ele também destacou a presença das Paróquias da Baixada Fluminense e do Rio de Janeiro.

Segundo Frei José Francisco de Cássia dos Santos, coordenador do SEFRAS, a pandemia chegou num momento em que a instituição estava se estruturando para “ser mais sustentável” com o trabalho de assessorias especializadas. “A questão de renda estava bastante difícil, inclusive nós fechamos duas casas de atendimento em 2018 e 2019, levando em consideração essa dificuldade de sustentabilidade, de adequação de caixa “, contou Frei José.

“Mas fomos surpreendidos com essa pandemia. Tudo o que estávamos fazendo como políticas de enfrentamento, articulações, todas as nossas pautas ficaram suspensas. As portas de nossas casas para a população de rua e para os imigrantes viraram um caos. Nós ficamos assustados com tudo aquilo e tivemos de aprender a administrar essa emergência da noite para o dia. Aliás, tudo o que passamos a fazer virou emergencial”, recordou. “E graças a Deus esse trabalho deu frutos a ponto de conseguirmos realizar e sustentar, tanto do ponto de vista econômico, estrutural e pessoal, o que virou o desafio da emergência na pandemia”, revelou.

Matar a fome se tornou o foco do trabalho do SEFRAS. Segundo Frei José, as famílias que vivem no entorno da Igreja do Pari e sede do Serviço, em São Paulo, ficaram sem o ganha-pão de seus trabalhos autônomos. “Tanto é que no Pari temos 1.500 famílias cadastradas, que vivem da economia informal e que não aparecem em nenhuma estatística do governo. Isso também aconteceu no Largo do São Francisco, onde foram cadastradas 350 famílias”. O ponto positivo foi o trabalho direto de 12 frades, além das Fraternidades de São Paulo, especialmente a do Pari e do São Francisco, e do Rio de Janeiro, como a do Convento Santo Antônio, da Rocinha e as da Baixada Fluminense, como São Francisco e Imbariê em Duque de Caxias, Nilópolis e São João de Meriti. “Hoje, nós temos contatos de cerca de 850 voluntários (as) que passaram pelo trabalho emergencial”, contou.

O resultado desse trabalho emergencial até agora: atendimento de 1,4 milhão de pessoas com refeições diárias; 8 mil famílias atendidas com cestas básicas; e o envolvimento de um batalhão de 850 voluntários. Atualmente, o Sefras, sem descuidar do trabalho nas regiões centrais de São Paulo e Rio, está focado também nas periferias. “Além do Chá do Padre, temos um ponto de atendimento na Baixada do Glicério, e doamos no mínimo 2.500 refeições por dia”, conta Frei José.

Para o coordenador do SEFRAS, três frentes de trabalho surgiram com a pandemia: a articulação de uma rede nacional de combate à fome; uma economia que gere renda; e o combate à toda forma de violência. Na opinião de Frei José, a luta pela garantia dos direitos é fundamental para a superação da violência: “Quanto maior a privação dos direitos, maior é a violência”.

Um ponto que mereceu destaque de Frei José nas tendas foi a diversidade de credos das pessoas. “E vieram por causa de São Francisco. Ele é a figura-chave que abre as portas para muita gente. É uma grande lição nesse tempo de pandemia. Já era antes, mas agora a gente teve uma mobilização maior de pessoas”, explicou.

O enfretamento à fome também mobilizou a Fraternidade de Curitiba, como contou Frei Alexandre Magno. “Tínhamos um antigo trabalho chamado ‘Acolhida Franciscana’, com um exército de voluntários (as), mas na sua maioria de pessoas idosas. Com a pandemia, ficamos sem eles. Então, começamos um trabalho com a Arquidiocese para convocar os jovens. Começamos a servir na rua, como nas tendas em São Paulo e no Rio. Mas a Prefeitura colocou restrições a isso e, de certa forma, isso acabou nos ajudando, porque ela ofereceu um restaurante onde pudemos oferecer 26 mil refeições no ano passado. Esse foi um dos pontos principais na cidade para a população com fome”, explicou Frei Alexandre, contando que a ampliação do programa mudou o nome também, que agora se chama “Mesa Fraterna”.

Ainda em Curitiba, dentro do espírito da Laudato Si’, deu-se início, com muito sucesso, ao projeto de uma pequena feira de orgânicos. “Foi uma forma de aproximar o homem da cidade do trabalhador do campo. Na feira são comercializadas frutas e hortaliças orgânicas produzidas pelo projeto. O objetivo é fortalecer agricultores camponeses, criar uma rede de orgânicos e produção agroecológica e cuidar do planeta”, acredita Frei Alexandre. Segundo ele, a ação do SEFRAS em São Paulo e Rio de Janeiro deu mais visibilidade para os trabalhos dos frades. “Aqui também se tornou uma referência”, informou o frade.

No Paraná, Frei Samuel Ferreira de Lima, o mestre dos frades professos temporários do tempo de Filosofia, contou que o trabalho dos frades se uniu ao grupo de jovens do Projeto “Todos Nós” de Campo Largo, que leva quentinhas à população de rua e pessoas em dificuldades. A Pastoral Hospitalar, da qual os frades participavam ativamente, teve de ser interrompida e é feita hoje de forma remota.

Frei Claudino Gilz, da equipe da Associação de Ensino Senhor Bom Jesus e coordenador da Frente da Educação, falou do projeto Bom Jesus Social, que está presente em todas as unidades do Colégio, “sempre com o propósito de promover, junto aos alunos e famílias, essa cultura do humanismo solidário”, a partir da natureza própria que é a educação. Quando as aulas foram interrompidas, todos os trabalhos foram paralisados. “E agora?”, perguntou. “Com o passar do tempo, fomos ficando inquietos e conseguimos outras estratégias para a solidariedade não parar”, revelou, emocionando-se.

Ainda no Paraná, em Pato Branco, onde os frades são muito conhecidos pelo trabalho na comunicação, Frei Gabriel Vargas Dias Alves deu um panorama do trabalho social na cidade, revelando que é bastante visível hoje o aumento da população em situação de rua. Através de um cadastramento, as famílias recebem cestas básicas em suas casas. Outro trabalho que chama a atenção é a missão SOS Vida, voltado para o acolhimento e reinserção social da população de rua. Ele é feito em três casas da missão, onde residem mais de 100 pessoas.

Frei James Luiz Girardi falou do trabalho nas paróquias franciscanas da Baixada Fluminense, onde é vigário paroquial da Paróquia São Francisco de Assis, em Duque de Caxias, cidade com a presença de outra Fraternidade em Imbariê. “Aqui, temos duas creches: São Gabriel e Santa Clara, que é administrada em parceria com o SEFRAS. Nós, como Paróquia, não teríamos como sustentar esse padrão exigido pela asssistência social. Com a pandemia, as crianças ficaram em casa, e, com a ajuda do SEFRAS, doamos cestas básicas para 80 famílias”, disse. Segundo ele, houve também na paróquia uma procura muito grande por alimento. “Temos distribuído centenas e centenas de cestas básicas às pessoas que vêm de vários lugares. Felizmente, o povo é generoso e tem colaborado muito”, avaliou.

Frei André Gurzynski, guardião da Fraternidade São Damião, na Missão de Angola, falou do trabalho social que é muito forte na capital, em Luanda. Como reside numa cidade menor, em Malange, tem se dedicado na consolidação do trabalho de justiça, paz, direitos humanos e imigrações.

Frei Marx também apresentou o Plano de Ação 2021, onde a proposta maior é articular entre as fraternidades e leigos espaços de visibilidade da opção evangélica e de construção do Reino de Deus em solidariedade para com os mais vulneráveis. As próximas tarefas deste grupo de frades serão: promover um levantamento das ações solidárias realizadas nos regionais da Província e se dedicar ao estudo e à revisão das Diretrizes da Frente da Solidariedade em vista da revisão do Plano de Evangelização prevista para o próximo Capítulo Provincial.

Ao final da reunião, o Secretário para a Evangelização, Frei Gustavo Medella, agradeceu e incentivou os frades a continuar neste trabalho. O próximo encontro dos frades será no dia 6 de maio, tendo como ponto principal o Plano de Evangelização. Frei Samuel Ferreira deu a bênção final pedindo a intercessão de Maria, Nossa Mãe, na Festa da Anunciação do Senhor.

 

Fonte: Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil

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