Tragédia em Brumadinho: nota de repúdio a mais um crime socioambiental em Minas Gerais

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O serviço de Justiça, Paz e Integridade da Criação (JPIC) da Ordem Franciscana Secular – Regional Minas Gerais, à luz do Evangelho e dos exemplos de Francisco e Clara de Assis, manifesta-se neste momento triste e revoltante para os mineiros e para o Brasil. Apenas 3 anos depois da tragédia de Mariana, o município de Brumadinho também vive agora um momento dramático e se torna símbolo evidente da urgência de mudanças estruturais que precisamos reivindicar e construir em nosso país.

Recusamo-nos a qualificar estas tragédias como “acidentes”! São casos concretos de crimes socioambientais graves, atentados assassinos a coletividades da vida humana e não humana que precisam de ampla manifestação social para que não sigam impunes e não voltem a se repetir. Por que nossa sociedade é tão intolerante com alguns crimes e criminosos e tão passiva e permissiva com outros?

Estes graves crimes socioambientais possuem vários autores: a nossa estrutura socioeconômica desumana, que trata todos os elementos da sociedade como mercadorias, passíveis de serem negociadas e vendidas, inclusive a vida humana e dos ecossistemas, assim como a imposição de que algumas vidas sejam mais importantes que outras. Por que não há barragens de rejeito de minério próximas a bairros ou condomínios de luxo? Com R$ 11 bilhões de lucro apenas entre janeiro de setembro de 2018, por que a Vale não investe em sistemas eficazes e seguros de prevenção e controle de acidentes? É aceitável que o bilionário presidente desta empresa venha a público dizer que os laudos “técnicos” apontam que o risco de desastre era baixo em Brumadinho?

O Estado brasileiro atualmente age como auxiliar ativo destes crimes socioambientais, ao invés de servir como instrumento de combate destes. Já se tem notícias de projetos de leis engavetados ou rejeitados, tanto em âmbito federal quanto no Estado de Minas Gerais, que serviriam de instrumentos jurídicos de combate a abusos das atividades de mineração. Os processos judiciais que garantiriam os reparos dos danos da tragédia-crime de Mariana ainda tramitam, gerando clima inaceitável de impunidade aos autores daquele crime. Os prefeitos das cidades de atividade mineradora são verdadeiros reféns das empresas. Ainda, os novos governos eleitos do Brasil e do Estado de Minas Gerais já apontaram em seus recém-começados mandatos para a estratégia política de enfraquecimento das ações de órgãos ambientais, chegando a tratar como criminosos os ativistas socioambientais que atuam na tentativa de limitar a ganância por lucros sem limites das elites minoritárias detentoras de poder econômico. Foi para isso que você votou nas últimas eleições?

Neste momento difícil, devemos agir inspirados nos ensinamentos de Jesus, o Cristo, Deus vivo que se fez humano e veio ao mundo para nos mostrar que é possível e necessário construirmos e vivermos um outro projeto de vida. Suas atitudes desagradaram os donos do poder de sua época, por isso foi perseguido, preso, torturado e morto: para que se calasse. Porém, venceu a morte e aqueles que queriam que se calasse, ressuscitou! E sua luta por um mundo diferente, após mais de dois mil anos, continua viva dentro de nós. São Francisco e Santa Clara seguiram radicalmente os exemplos de Jesus e, por isso, foram também perseguidos e taxados como loucos por pregarem a palavra de Deus através do amor incondicional a todos os seres da Terra, humanos e não humanos. Nos guiemos também nos exemplos atuais de atitude cristã coerente do Papa Francisco, que humildemente nos pede para sermos “Igreja em saída”.

Neste sentido, como franciscanos e franciscanas, pedimos que neste momento difícil não deixemos de exercer as três dimensões de nossa fé cristã: a oração pelas vítimas deste crime, seus parentes e amigos, assim como pela nossa mãe e irmã Terra, nossa Casa Comum, e toda sua vida impactada; a caridade em sua prática assistencial, na forma de doações de materiais e tempo livre, que amenize o sofrimento emergencial das vítimas deste crime; e a terceira: a caridade em sua prática de transformação sócioestrutural, para que crimes como esses não voltem a acontecer. Devemos nos juntar aos militantes de movimentos sociais como o MAM (Movimento pela Soberania Popular na Mineração), à Rede Igrejas e Mineração e o Grupo de Trabalho sobre a Mineração da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Precisamos apoiá-los, conhecer suas reivindicações e dar-lhes voz e notoriedade.

É momento de luto e de luta, irmãos e irmãs! Que a tristeza e revolta de hoje se transformem em grito permanente de justiça e paz.

Paz e Bem.

Leandro Garcez Targa
JPIC Regional 

Zélia de Souza Rogedo
Ministra Regional

Publicada em 29 de janeiro de 2019.
Fonte: OFS MG

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