Reflexão: Sequestraram Nossa Senhora de Fátima

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O sequestro sempre fez parte da história da humanidade. É a arma dos covardes. Ao sequestrarem uma pessoa, exigem um preço para o seu resgate.

Foi assim com José do Egito. Com medo de sua importância junto ao velho pai, seus irmãos sequestraram-no e entregaram-no aos egípcios. Não é anormal os noticiários trazerem à tona que este acontecimento continua sendo uma artimanha dos covardes.

Sequestraram Nossa Senhora de Fátima. Sim, a mulher pobre de Nazaré, a primeira discípula de Jesus, esposa de José.

A Virgem apareceu a três pobres crianças, na Cova da Iria, interior de Portugal, quando pastoreavam um rebanho de ovelhas. Foram cinco aparições, com uma bela mensagem: penitência e oração. Penitência é o arrependimento por uma ação má. Oração é manter-se na intimidade de Deus, que é o Sumo Bem. Os dois pedidos de Maria completam-se, não se excluem. Para libertar o coração inclinado ao mal, é necessário uma força maior, e essa força só pode vir de Deus, pela experiência da oração e a vivência da Palavra.

Grupos de católicos tradicionalistas, sequestraram a Virgem pobrezinha. Em nome do tradicionalismo e não da sã Tradição, colocam palavras na boca da Senhora. Fazem com que ela diga o que nunca disse na vida diária de Nazaré. Dizem, em nome dela, sobre o perigo do comunismo, da necessária comunhão diária, da reza do Rosário, da confissão frequente.

Pela boca destes, Maria nunca fala do Magnificat, de Javé o Deus dos pobres, de Deus que se encanta com os humildes e neles fixa os olhos. O realizador de maravilhas, como a derrubada dos tronos, do soerguimento dos pobres e humilhados. Não, ela, como é apresentada, parece ter sofrido uma amnésia quanto ao seu cântico, registrado pelo evangelista Lucas. Nos andores, sua imagem branca, é levada aos palácios, onde Herodes, continua perseguindo o Menino, para matá-lo. Invocam sua benção sobre facínoras, que manipulam a Palavra de Deus, como “A verdade vos libertará”. Tudo para ludibriar o povo, fazendo-se arautos da verdade, da honestidade, da honradez. Lobos travestidos de cordeiros, que na calada da madrugada, arquitetam mentiras, subornos. Se fazem de paladinos do bem, mas, negam a ciência, a pandemia, a vacina. Sem a necessária credencial, receitam remédios sem a comprovada eficácia. Debocham das mortes, dizendo: e daí ou eu não sou coveiro! Incentivam os conflitos, abrem guerra midiática a quem pensa diferente. Colocam as instituições do Estado ao serviço próprio.

Esquecem que Maria de Fátima, de Lourdes, de Aparecida, de Guadalupe, têm lado: o lado dos pobres. Esquecem que, em Fátima, ela apareceu a pequenos e insignificantes pastores. As políticas governamentais não contemplam os pequenos agricultores, trabalhadores sem terra. Invadem os assentamentos, jogam veneno em suas plantações de subsistência, criminalizam o movimento dos sem terra. Estão devastando a Amazônia, passando a boiada, dita pelo Ministro Sales.

Esquecem que, em Lourdes, Maria, apareceu a uma menina e aquele lugar tornou-se uma benção para os doentes. Basta ver o descuido com a saúde do povo, a falta proposital de vacinas, a falta de oxigênio, o desvio de verbas públicas, o desmonte do SUS, a reforma da Previdência Social.

Esquecem que, em Aparecida, Maria se fez preta. O racismo brasileiro é estrutural e cultural. A chacina do Jacarezinho, é um retrato de como os pretos e as pretas são tratados pelo poder público. Esquecem que, em Guadalupe, Maria se fez índia, ao lado de um pobre índio. A invasão as terras indígenas, o garimpo ilegal, a brutalidade dos madeireiros, a poluição dos rios, a derrubada e queimada das matas; é a mais cruel guerra aos nossos povos originários.

Maria de Nazaré, nunca frequentou o Palácio de Herodes. Não cantou hinos religiosos invocando as bênçãos sobre César. Não jogou água benta em Pilatos.

Maria de Nazaré, de Fátima, de Lourdes, de Aparecida, de Guadalupe; percorreu caminhos de fraternidade, derrubou muros, construiu pontes.

Maria, a Senhora Pobrezinha, de Belém, da Galileia, de Caná, do Calvário, do Cenáculo; não é a que entra nos palácios, que confirma a tirania, que aprova a rejeição aos glbtsq+, a que persegue os moradores de rua, que abusa dos menores.

Não, a Maria do Evangelho, é outra. E chora, quando vê que seu nome, imagem, são usados para confirmar tudo que é anti Evangelho.

Sequestraram Nossa Senhora de Fátima, em nome de uma religião ritualista, legalista, fria, sem coração, sem ternura, sem misericórdia!

Que pena, sequestraram Nossa Senhora de Fátima!

Por Pe. Éderson Queiroz
Arquidiocese de Uberaba – MG

Fonte: O Caminho do Reino – Blog das Comunidades

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